segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Pedaço de papel


Esqueci um pedaço de papel perto do banco. Cheguei em casa, abri meus livros e não encontrei nada. Esvaziei os bolsos, contei as moedas, sacudi as meias, mas nada. Tinha que estar em algum lugar. Refiz meu dia, contei meu troco, lembrei do sanduíche, da rua, do atraso, do café, do trabalho, do trânsito, dos faróis, do céu sem nuvens e da minha sufocante mania de não saber o que querer. Lembrei da rua, das janelas, da multa, e da sensação de alguém que me olha, e que deve ter a mesma sensação de que eu a olho, ou não. Lembrei da minha indecisão, que eu não queria lembrar, mas que eu não quis esquecer (ou quis?). Lembrei da comida que não me fez bem, do vento frio que eu gostava, do silêncio na rua de noite, e daquela sensação de bem estar que eu não sabia de onde vinha. Escrevi num pedaço de papel, para que eu pudesse lembrar. Bem pequeno, pra caber em qualquer bolso, pra eu poder levar e dar pra quem me olha, ou quem eu olho. Sentei num banco perto de casa, e li o que escrevi, o que você já sabia, sem ter que me olhar. Olhei meus livros, acendi e apaguei a luz, procurei embaixo do sapato, mas nada. Voltei e sentei no banco, quis deitar, descansar e esquecer de tudo, esquecer de dormir e fazer as coisas de amanhã. Talvez alguém as fizesse pra mim, seria bom. Olhei pro banco e pro céu vazios, e percebi que ninguém me olhava, por mais que eu quisesse ser olhado, como eu te olho. Quis escrever outro pedaço de papel, mais um pra pôr no bolso, e perder de propósito pra você não ver. E pra você não saber, escondida, o que você já sabe.

Um comentário:

Kinha disse...

"Agora eu já sei..."
;)